sábado, 15 de agosto de 2009

Admoestação do Céu —1830

O presente sonho está somente esboçado nas Memórias do Oratório com estas palavras:
"Por aquele tempo tive outro sonho, no qual fui severamente admoestado, por ter posto minha esperança nos homens e não no Pai Celestial".
Para compreender o significado destas palavras, temos que recordar um fato decisivo da infância de São João Bosco.

São João Bosco conhece o seu primeiro protetor aos 10 anos; Dom José Calosso

Era uma tarde do ano 1825; voltava João da Butigliera, alegre aldeia próxima ao Becchi. Tinha ido só com o piedoso fim de assistir a uma Missão que ali se dava, para lucrar o Jubileu do Ano Santo, concedido por Leão XIII e estendido já ao círculo católico.

Seu porte era grave e sereno; sua compostura e recolhimento, chamaram poderosamente a atenção de um sacerdote que lhe seguia: Dom José Calosso, capelão da aldeia de Murialdo. O sacerdote, fazendo ao menino sinal de que se aproximasse, perguntou-lhe quem era, de onde vinha e por que sendo de tão curta idade, ia aos sermões da Missão, acrescentando:

—Certamente tua mãe teria feito uma conversa melhor e mais adequada a tua idade e condição.

Joãozinho afirmou que, em efeito, as conversas de sua mãe eram muito proveitosas, mas que lhe agradava ouvir os missionários; aos quais entendia perfeitamente, e para demonstrá-lo foi repetindo ao sacerdote, quase literalmente, os sermões ouvidos ponto por ponto.

Maravilhado o virtuoso capelão dos dotes de engenho do pequeno, perguntou-lhe emocionado:

—Você gostaria de estudar?
—Muito! —replicou Joãozinho —. Mas não posso.
—Quem lhe impede isso?
—Meu irmão Antonio, pois diz que estudar é perder o tempo; que é melhor que me dedique às tarefas do campo.
—E você, para que quereria estudar?
—Para chegar a ser sacerdote.
—E para que desejas ser sacerdote?
—Para poder instruir a muitos de meus companheiros que não são maus, mas que chegarão a sê-lo se ninguém se ocupa deles.

Dom Calosso, comovido perante esta maneira de raciocinar, tomou sob seu amparo ao menino, dando-lhe aula durante os invernos de 1827 e 1828.

Dom José Calosso falece quando
São João Bosco tinha 15 anos

Mas numa manhã de outono de 1830, enquanto João se encontrava em sua aldeia nativa visitando sua mãe, recebe aviso de voltar rapidamente para Murialdo, pois seu bom professor Dom Calosso, atacado repentinamente de enfermidade mortal, chama-lhe com urgência. Voou João ao lado de seu benfeitor, ao qual encontrou desgraçadamente no leito, perdido já o uso da palavra. O moribundo pôde reconhecer ao amado discípulo a quem fez sinal de aproximar-se, e fazendo um esforço supremo lhe consignou uma chave que guardava debaixo do travesseiro, assinalando a mesa de seu escritório. O discípulo tomou a chave, ajoelhou-se junto ao leito de seu benfeitor e ali permaneceu aflito e suplicante até que o professor, e amigo de sua alma faleceu, sem ter podido articular palavra.

Morto Dom Calosso, chegaram os sobrinhos; João lhes entregou a chave recebida de seu professor dizendo:

—Seu tio me entregou esta chave indicando-me que não a desse a ninguém. Várias pessoas me asseguram que é meu quanto a gaveta da mesa contém, mas Dom Calosso nada me disse expressamente. Prefiro minha pobreza a ser causa de desgostos. Eles tomaram a chave e quanto havia na gaveta da mesa.

A morte do benfeitor foi um verdadeiro desastre para o João. Amava a Dom Calosso meigamente. Sua lembrança ficou gravada para sempre em sua alma, deixando consignados estes sentimentos em suas Memórias com estas palavras:

"Sempre roguei a Deus por este meu benfeitor, e, enquanto viva, não deixarei de rezar por ele".

Conhecido este episódio e o estado de ânimo do jovem estudante, é fácil compreender o significado e alcance deste sonho.
(M. B. Tomo I, pág. 218.—M. O. Década 1 -4, págs. 43-44)

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