sábado, 15 de agosto de 2009

Sobre o estado das consciências — Parte 1 — 1860

A narração deste sonho (ou revelação) maravilhoso o vamos a dividir em 3 partes, pois é bastante extenso e cheio de detalhes
Durante as noites correspondentes às datas compreendidas entre o 28 e em 30 de dezembro de 1860, São João Bosco teve três sonhos, como ele os chama e que nós, por quanto vimos, ouvido e comprovado, podemos qualificar com toda segurança, de autênticas visões celestiales.
Trata-se de um mesmo sonho três vezes repetido, embora acompanhado de circunstâncias diversas.
Eis aqui o resumo do mesmo, tal como saiu de lábios do Santo na noite última do ano 1860, ao relatá-lo a todos os jovens reunidos para escutar suas "boas noites".
Pareceu-me estar durante três noites em um campo, na Rivalta, em companhia de [São] José Dom Cafasso, do Silvio Pellico e do Conde Cays.
A primeira noite a passamos discorrendo sobre certos pontos de religião relacionados com os tempos atuais. A segunda a dedicamos a conferências morais nas que propúnhamos e resolvíamos diversos casos de consciência, referentes principalmente à direção da juventude.
Ao comprovar que durante duas noites consecutivas tinha tido o mesmo sonho, determinei contá-lo a meus queridos filhos se porventura voltava a sonhar o mesmo pela terceira vez.
E eis aqui que na noite do 30 aos 31 de dezembro, pareceu-me estar novamente no mesmo lugar e em companhia dos mesmos personagens.
Deixando à parte outra preocupação, veio-me à mente o pensamento de que o dia seguinte, último do ano, tinha que dar o "Aguinaldo" (Aguinaldo é um pago especial que se entrega aos trabalhadores assalariados, constituindo um salário a mais às 12 mensalidades), ou seja, as lembranças aos meus queridos filhos. Por isso, me dirigindo a [São] José Dom Cafasso, disse-lhe-.
— Você que são meu grande amigo, me dê o "Aguinaldo" para meus filhos.
Ele replicou-me:
— Vamos devagar. Se quiser que te dê o "Aguinaldo" para seus jovens, vê primeiro e lhes diga que preparem e ajustem bem suas contas.
Encontrávamo-nos nesse momento em uma grande sala, em meio da qual havia uma mesa. [São] José Dom Cafasso, Silvio Pellico e o Conde Cays foram sentar-se junto a ela. Eu, para obedecer ao primeiro, saí da habitação e fui chamar a meus moços, que estavam fora, fazendo com cada um uma soma em um papel que tinham na mão.
Os jovens começaram a entrar na sala um por um, levando consigo seus papéis nos que se viam muitas quantidades para somar; e apresentando-se aos mencionados personagens, ensinavam-lhes suas contas. Aqueles senhores comprovavam o resultado, e se a soma era exata e os números estavam claros, os devolviam a cada um. Mas se as cifras estavam rabiscadas nem se dignavam de olhá-las.
Os primeiros representavam àqueles que têm suas contas ajustadas; os segundos, os de consciência embrulhada. Estes últimos eram bastante numerosos. Os que saíam com suas contas aprovadas partiam contentes da sala e se dirigiam ao pátio a jogar; os outros, em troca, ficavam tristes e angustiados.
Uma grande multidão de jovens esperava à porta daquele salão com o papel na mão a que lhe chegasse o turno.
Algum tempo demorou esta tarefa, até que finalmente não se apresentou ninguém.
Parecia que tinham desfilado por ali todos os jovens, quando [São] João Dom Bosco, ao ver alguns que estavam esperando e não se apresentavam perguntou a [São] José Dom Cafasso:
—E estes o que fazem?
—Estes, replicou [São] José Dom Cafasso, não têm nenhum número escrito no papel, portanto não podem fazer nenhuma soma; pois aqui se trata de saber o total do que se possui, pelo que se fez, por isso estes jovens devem ir primeiro a encher o papel de números e que venham depois, que então poderão fazer a adição.
Desta maneira terminou aquela grande revisão de contas.
Então saí da sala com os três personagens, nos dirigindo ao pátio, onde vi um grande número de jovens: eram aqueles cujos papéis estavam cheios de cifras colocadas em ordem. Entretinham-se em correr, saltar e jogar em meio de uma alegria extraordinária. Eram tão felizes como outros tantos príncipes. Não se podem imaginar a alegria que eu experimentava ao vê-los tão contentes.
Mas havia certo número de jovens que não participavam dos jogos de outros, mas sim se distraíam contemplando a seus companheiros. Entre eles, havia uns que tinham uma atadura nos olhos, outros uma densa névoa, outros uma nuvem escura ao redor da cabeça. Alguns jogavam fumaça pela cabeça, outros tinham o coração cheio de terra, outros vazios das coisas de Deus. Eu os vi e os conheci perfeitamente; de forma que poderia nomeá-los um a um desde o primeiro ao último.
Enquanto isso me dava conta de que no pátio faltavam muitos de meus moços e me disse para mim depois de ter refletido um pouco: Onde estão aqueles que tinham o papel completamente em branco?
Olhando para uma e outra parte, ao fim fixei a vista em um canto do pátio e oh, terrível espetáculo! Vi um dos jovens tendido no chão e pálido como a morte. Outros estavam sentados sobre um banco baixo e sujo, outros jogados sobre um colchão de palha, outros atirados sobre o nu chão, outros recostados sobre as mesmas pedras. Eram todos aqueles que não tinham suas contas ajustadas. Afligia-lhes uma grave enfermidade que lhes afetava os olhos, à língua, os ouvidos; os órgãos atacados apareciam roídos de vermes. Havia um que tinha a língua completamente podre, outro com a boca cheia de lama e outro de cuja garganta saía um fedor insuportável. Diversas eram as enfermidades desses infelizes. Quem tinha o coração carcomido, débil, corrompido; quem padecia uma úlcera, quem outra; havia um num completo estado de decomposição. Aquilo parecia um verdadeiro hospital. Em presença de semelhante espetáculo fiquei completamente desconcertado, sem poder dar crédito a quanto estava vendo. Então exclamei:
— Mas o que é isto?
E me aproximando de um daqueles desgraçados, perguntei-lhe:
— Mas não é você N. N.?
— Sim — me replicou — eu sou.
— E como é que te encontras em um estado tão deplorável?
—O que quer? — disse-me —. Farinha de meu costal. Já vês! Este é o fruto de minhas desordens.
Aproximei-me de outro e obtive a mesma resposta. Tal espetáculo me produzia no coração o efeito de um agudo espinho cravado, cuja dor me fez-se mais suportável ao contemplar o que seguidamente lhes vou contar.
Com o coração cheio de dor dirigi-me a [São] José Dom Cafasso e lhe perguntei em tom de súplica:
—Que remédio devo empregar para curar a estes meus pobres filhos?
—Você sabe como eu o que se deve fazer — me replicou [São] José Dom Cafasso —. Não necessitas que o diga. Medite um pouco. Engenhe-se.
Depois me fez sinal de que lhe seguisse e aproximando-se do palácio do qual tínhamos saído, abriu uma porta. Eis aqui que então me encontrei em um magnífico salão, adornado de ouro, de prata e de toda sorte de filigranas; iluminado por milhares de abajures cada um dos quais despedia uma luz tal que minha vista não podia resistir seu resplendor.
Tanto a largura como a longitude daquele local eram, consideráveis. Em meio daquele salão, verdadeiramente régio, havia uma ampla mesa repleta de confeitos de todas as espécies.
Havia amêndoas recobertas de açúcar de um tamanho extraordinário; bolachas descomunais, de maneira que uma só teria sido suficiente para saciar a um jovem. Ao ver isto tentei sair precipitadamente para chamar a meus jovens e lhes convidar a que viessem ver aquela mesa, e para que contemplassem o magnífico espetáculo que oferecia aquele salão. Mas [São] José Dom Cafasso me deteve imediatamente exclamando:
—Devagar! Não todos podem comer destas bolachas e destas amêndoas. Chamem somente aos que têm suas contas em ordem.
Assim o fiz e em um instante a sala se viu cheia de moços.
Continuamos no post de amanhã...

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