sábado, 15 de agosto de 2009

Um passeio no Paraíso — Parte 2 — 1861

Na noite de 8 de abril (São) João Dom Bosco se apresentou ante os jovens que estavam desejosos de ouvir a continuação do relato.
Antes de começar deu alguns avisos disciplinares.
O servo de Deus se deu conta da impaciência dos jovens e jogando um olhar a seu redor, prosseguiu depois de uma breve pausa com aspecto sorridente:
SEGUNDA PARTE
Recordarão que havia um grande lago cheio de sangue, ao fundo do vale, próximo ao primeiro lago!
Depois de ter contemplado as várias cenas anteriormente descritas e de percorrer o altiplano de que lhes falei, encontramo-nos ante um passo livre pelo que podemos prosseguir nosso caminho.
Prosseguimos, pois, adiante eu e meus jovens através de um vale que nos levou a uma grande praça. Penetramos nela; a entrada de dita praça era larga e espaçosa, mas depois se ia estreitando cada vez mais, de forma que ao fundo, perto já da montanha, terminava em um atalho aberto entre duas rochas pelo que apenas podia passar um homem por vez. A praça estava cheia de gente alegre que se divertia despreocupadamente, dirigindo-se ao mesmo tempo ao atalho que levava à montanha.
Perguntávamos-nos uns aos outros:
— Será este o caminho que conduz ao Paraíso?
Enquanto isso, os que se encontravam naquele lugar se dirigiam um após o outro com a idéia de passar por aquele estreitamento, e para consegui-lo tinham que ajustar bem as roupas, encolher os membros quanto podiam e inclusive abandonar a bagagem ou quanto levavam consigo.
Isto me deu a entender que em realidade, aquele era o caminho do Paraíso, posto que para ir ao céu não basta somente estar livre de pecado, mas também de todo pensamento, de todo afeto terrestre, segundo o dito do Apóstolo: Nihil coinquinatum intrabit in eo.
Estivemos observando aos que passavam como por uma hora. Mas quão néscio fui! Em vez de tentar o passo daquele atalho, preferimos voltar atrás para ver o que havia ao outro lado da praça. Tínhamos divisado outra multidão de gente naquele lugar e desejávamos saber o que era o que faziam. Atravessamos, pois, por um caminho muito largo e cujo fim não podia ser apreciado pelo olho humano. Ali contemplamos um estranho espetáculo. Vimos numerosos homens e também a muitos de nossas jovens jungidos com animais de diversas espécies. Alguns estavam aparelhados com bois.
Eu pensaria:
— O que quererá dizer isto?
Então recordei que o boi é o símbolo da preguiça e deduzi que aqueles jovens eram os preguiçosos. Conhecia-os todos: eram os lentos, os frouxos no cumprimento de seus deveres. E ao me vê-los dizia mesmo:
— Sim, sim; está-lhes muito bem empregado. Não querem fazer nada e agora têm que suportar a companhia desse animal.
Vi outros jungidos com asnos. Eram os teimosos. Assim aparelhados tinham que suportar pesadas cargas ou pastar em companhia daqueles animais. Eram os que não faziam caso dos conselhos, nem das ordens dos superiores. Vi outros jungidos com mulos e com cavalos e recordei o que diz o Senhor: Factus est sicut equus et mulus quibus non est intelectus (fazem como os bois e os asnos que não tem intelecto). Eram os que não querem pensar nunca nas coisas da alma: os que não tem juizo.
Vi outros que pastavam em companhia dos porcos: caiam nas imundícies e na lama como esses animais e como eles chafurdavam na lama. Eram os que se alimentam somente de coisas terrenas; os que vivem entregues às baixas paixões; os que estão afastados do Pai Celestial. Oh lamentável espetáculo! Então me recorde do que diz o Evangelho do Filho pródigo: que ficou reduzido ao mais miserável dos estados.
Vi depois muitíssima gente e a numerosos jovens em companhia de gatos, de cães, galos, coelhos, etc., etc.; ou seja, aos ladrões, aos escandalosos, aos soberbos, aos tímidos por respeito humano, e assim sucessivamente.
Ao contemplar esta variedade de cenas, demo-nos conta de que o grande vale representava o mundo. Observei atentamente a cada um daqueles jovens e de ali dirigimos a outro lugar também muito espaçoso, que formava parte da imensa planície. O terreno oferecia um pouco de declive, de forma que caminhávamos quase sem nos dar conta.
A certa distância vimos que a paragem tomava o aspecto de um jardim e nos dissemos:
— Vamos ver o que é aquilo?
— Vamos!, — exclamaram todos —.
E começamos a encontrar muito formosos rosas encarnadas.
— Oh, que belas rosas! Oh, que belas rosas!, — gritavam os jovens enquanto corriam às agarrar —. Mas, apenas as tiveram em suas mãos, deram-se conta de que despediam um aroma desagradável em extremo. Os moços não puderam dissimular seu desagrado. Vimos também numerosas violetas, na aparência viçosas, e que creímos despediriam agradável fragrância; mas quando nos aproximamos de as agarrar para formar alguns ramalhetes, demo-nos conta de que seus caules estavam murchos e que despediam um aroma desagradável.
Prosseguimos sempre adiante e eis aqui que encontramos uns encantadores bosques cheios de árvores tão carregadas de frutos que era um prazer contemplá-los. Em especial, as macieiras, que deliciosa aparência tinham! Um jovem correu imediatamente e cortou de um ramo uma formosa fruta de aparência fragrante e amadurecida, mas apenas a teve entre os dentes, arrojou-a indignado longe de si. Estava cheia de terra e de areia e ao degustá-la sentiu desejos de vomitar.
— Mas o que é isto?, — perguntamo-nos —.
Um de nossos jovens, cujo nome não recordo, disse-nos:
— Isto significa a beleza e a bondade aparente do mundo. Tudo nele é insípido, enganoso!

Enquanto estávamos pensando aonde nos conduziria nosso atalho, demo-nos conta de que o caminho que levávamos descia quase insensivelmente. Então, um jovenzinho observou:
— Por aqui vamos baixando cada vez mais; parece-me que não vamos bem.
— Já veremos, — respondi-lhe —.
E seguidamente apareceu uma multidão incalculável que corria por aquele mesmo caminho que levávamos nós. Uns foram de carro, outros a cavalo, outros a pé. Quais saltavam, saltavam, cantavam e dançavam ao som da música e ao compasso dos tambores.
O ruído e a gritaria eram ensurdecedores.
— Vamos deter-nos um pouco — dissemos — e observemos a esta gente antes de prosseguir em sua companhia.
Então um jovem descobriu em meio daquela multidão a alguns que pareciam dirigir a cada um dos blocos. Eram indivíduos de agradável aparência, vestidos de uma maneira elegante, mas por debaixo do chapéu apareciam os chifres. Aquela planície, pois, era o mundo pervertido dirigido pelo maligno. Est via quae videtur reta, et novissima ejus ducunt ad morten. (Esta via reta e direta que os levava à morte)
De repente o interprete (que nos acompanhava) disse:
— Olhem como os homens vão parar ao inferno quase sem dar-se conta.
Depois de ter contemplado isto e de ouvir estas palavras, chamei aos jovens que estavam diante de mim, os quais vieram a meu encontro correndo e gritando:
— Nós não queremos seguir por aí!
E seguidamente voltaram precipitadamente para trás desfazendo o caminho percorrido e deixando-me sozinho.
— Sim, tendes razão — quando me uni a eles —; fujamos logo daqui; voltemos atrás, de outra maneira, sem nos dar conta, iremos também nós a parar ao inferno.
Quisemos, pois, voltar para a praça da que tínhamos partido e seguir o atalho que nos conduziria à montanha do Paraíso; mas qual não seria nossa surpresa quando, depois de um longo caminhar, encontramo-nos numa pradeira. Voltamo-nos para uma e outra parte sem conseguir nos orientar.
Alguns diziam:
— Erramos o caminho.
Outros gritavam:
— Não; não nos equivocamos: o caminho é este.
Enquanto os jovens discutiam entre si e cada um queria manter o próprio parecer, eu despertei.
Esta é a segunda parte do sonho correspondente a segunda noite. Mais, antes que se retirem, escutem. Não quero que dêem importância a meu sonho, mas recordem que os prazeres que conduzem à perdição não são mais que aparentes; só oferecem uma beleza exterior. Estejam em guarda contra aqueles vícios que nos fazem semelhantes aos animais, até o ponto de nos igualar com eles; especialmente cuidado com certos pecados que assemelham aos animais imundos! Oh, quão desonroso é para uma criatura racional, ter que ser comparada aos bois e aos asnos! Quão abominável é para quem foi criado a imagem e semelhança de Deus e constituído herdeiro do Paraíso, cair na lama como os porcos ao cometer aqueles pecados que a Escritura assinala ao dizer: vivem na luxuria.

Somente lhes contei as circunstâncias principais do sonho e de forma resumida; pois, se lhes tivesse exposto tal e como foi, teria sido muito comprido. Igualmente, ontem de noite somente lhes fiz um resumo de quanto vi. Amanhã lhes contarei a terceira parte.

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